Artigo: Infraestrutura, Câmbio e Juros são os desafios (*)
Artigo,Economia | Por em 17 de dezembro de 2010
Neste ano que se encerra, a indústria eletroeletrônica viveu um grande paradoxo. Apesar do ambiente de grandes dificuldades, as empresas do setor demonstraram competência e capacidade para atender às demandas do mercado, fechando o ano, a maioria delas, com desempenho positivo.
Com as indústrias limitadas, basicamente, ao mercado interno, o nosso setor está encerrando 2010 com crescimento de 11% em seu faturamento. Entretanto, este índice favorável não pode mascarar alguns pontos extremamente relevantes.
O primeiro deles é a base fraca de comparação, visto que, em 2009, o setor sofreu uma forte retração por conta da crise internacional. No entanto, quando confrontado com 2008, o crescimento deste ano não chega a 1%.
Outro ponto relevante a se destacar é o déficit negativo recorde registrado, de US$ 27,5 bilhões, resultado de importações de US$ 35,3 bilhões e exportações de US$ 7,8 bilhões. O lamentável é que 21,5% dessas importações são constituídas por produtos acabados e não apenas por insumos, como ocorria até recentemente.
Isso nos leva a um terceiro ponto, o mais preocupante deles: o processo de desindustrialização por que passam segmentos da nossa indústria. Como tenho insistido, há mais de três anos, a questão cambial, que agora mobiliza o mundo inteiro, está corroendo as nossas cadeias produtivas e, por consequência, a nossa capacidade de competir, tanto no mercado externo como no interno.
Contudo, a confiança no país, daqueles que investem em produção e geram empregos, permanece inabalada. Temos pela frente uma série de oportunidades, que, se forem bem planejadas, poderão se transformar numa efetiva alavanca para impulsionar a indústria instalada no país ao patamar de importância que sempre ocupou.
Exemplo destas oportunidades, são os investimentos superiores a US$ 40 bilhões que a Petrobras fará, até 2014, em projetos de exploração de petróleo e gás. Estes investimentos poderão servir para o aumento da participação do conteúdo local nos fornecimentos para a estatal, uma reivindicação da Abinee. Nosso apelo é que esse extraordinário valor contemple todos os elos da cadeia de petróleo e gás, onde estão incluídos os produtos eletroeletrônicos.
Também surgem como real possibilidade, os grandes eventos esportivos que se realizarão no Brasil nos próximos anos, como a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016. Neste sentido, temos que exigir, desde já, dos Comitês organizadores um planejamento dos investimentos e projetos para que as obras não se atrasem, limitando a capacidade de fornecimento das nossas empresas, e que, na última hora, reste somente a possibilidade da importação. Tenho absoluta certeza de que, se houver verdadeiramente vontade de priorizar a produção e mão de obra locais, a nossa indústria estará apta para atender às demandas.
Independentemente de se preparar para receber estes e outros grandes eventos, o Brasil precisa investir pesadamente para resolver um de seus maiores e antigos gargalos: a infraestrutura deficiente. Este desafio tem que ser encarado no seu mais amplo espectro, não se limitando, simplesmente, à questão dos ineficientes portos, aeroportos e rodovias, mas, também, cuidando da infraestrutura energética e de comunicação. Nestes dois casos, não podemos correr o risco de apagões.
Neste contexto, uma questão precisa ser resolvida: o gasto público. O governo precisa gastar menos e gastar bem, ou seja canalizar seus investimentos em obras realmente necessárias.
A carência é grande, mas o futuro é promissor. Desta forma, os desafios precisam ser vencidos. Ao lado das sempre necessárias reformas estruturais – tributária, política, trabalhista -, no topo dos obstáculos, e o mais urgente a ser superado, está o binômio câmbio e juros.
Neste caso, o Brasil parece reagir como o primo rico da economia mundial, e não como um país emergente que é. As nações mais prósperas da Ásia e da América não se fazem de rogadas e se jogam com tudo na guerra cambial. Desvalorizam suas moedas, reduzem a quase zero as suas taxas de juros, protegem as suas indústrias e os empregos por elas gerados. Enquanto isso, no Brasil, prevalece o fundamentalismo de mercado. Alguns teóricos e gestores acreditam que o mercado acabará encontrando naturalmente o equilíbrio da taxa de câmbio. Enquanto esse equilíbrio não vem, a desindustrialização avança. A recente notícia de que setores do governo, finalmente, passaram a admitir este fato, é uma oportunidade para que medidas, como as que a Abinee apresentou a representantes do poder público, sejam adotadas para minimizar a perda de competitividade da indústria brasileira.
Os primeiros movimentos, vindos de Brasília, envolvendo os futuros integrantes do governo da presidente Dilma Rousseff, indicam que há disposição para fazer o que precisa ser feito em relação ao câmbio e aos juros. Cresce o entendimento de que a taxa cambial só tenderá a convergir para níveis satisfatórios quando os juros domésticos estiverem no mesmo patamar dos internacionais.
Como sempre ocorre, toda mudança de governo renova as nossas esperanças de que o Brasil possa vencer os obstáculos e seguir o caminho do crescimento sustentado. É claro que estes desafios são grandes, mas precisamos encará-los. Portanto, mãos à obra!
(*)Humberto Barbato, presidente da ABINEE.